Na primeira metade da década de 1960 as bandas inglesas formadas por garotos que descobriam um mundo musical composto por Elvis Presley, Chuck Berry, Buddy Holly, Eddie Cochran, começavam a fazer sucesso.
Músicos de rock ingleses tocavam das rádios. Gravavam discos. Faziam shows e mais shows. Alguns clubes se especializaram em fazer shows somente com o novo gênero.
Mais importante: o público crescia. E se crescia o público, crescia também os interessado em tocar. Os garotos que compravam instrumentos e aprendiam a tocar as músicas preferidas.
E montavam bandas para tocar como aquela banda que gostavam.
É o caso de The Who. União de quatro jovens que se conheciam de vista que somente ocorreu pela vontade comum de montar uma banda de rock.
Os primeiros trabalhos da banda remam em caminho semelhante àquele que os Kinks faziam. Criação de um rock ágil, agressivo. Juntando a característica principal do rock inglês: se comunicar com sua juventude, com seus pares que os escutavam.
Mas o rock evolui para mais que um movimento geracional. Ganha profundidade.
Beach Boys já conferiam esta profundidade do outro lado do Atlântico. E na ilha bretã era a vez dos Beatles.
Não ficando para trás, o Who lança The Who sell out, disco conceitual que reproduz uma rádio pirata, com direito a propagandas - desenvolvidas por eles mesmos de produtos reais, como a lata de feijões Heinz.
O real sucesso artístico será alcançado pelo quarteto um par de anos depois quando lançam Tommy. A primeira ópera rock conquista público e crítica. Muito mais do que uma história psicodélica, Tommy é um exercício conceitual interessante.
Como é possível contar uma história somente por meio de música, sem qualquer alegoria visual?
Como é possível trocar de narrador? Ou de situação?
Quem não conhece o trabalho poderia dizer: pela troca de faixas. Uma música se refere a um personagem.
Bom, não é tão simples. E o exercício proposto por Pete Townshend (compositor da obra) é muito mais complexo.
Isso porque as alterações de situação, personagem ou narrador ocorre no meio da música, e o retorno ocorre na própria música.
Tudo isso nos sendo dirigido pela melodia. Pela harmonia.
A música que vinha despejando a velocidade da guitarra de Townshend com a bateria de Moon e a poderosa voz de Daltrey, suaviza para sobrar apenas um clamor doce de Tommy - o protagonista surdo, cego e mudo - na voz do próprio Townshend, que pede para ser visto, sentido, tocado, curado.
Uma criação estética ímpar que elevou o rock a outro patamar.
Ouça aqui o álbum completo: Tommy
Ou ouça Go to the mirror, canção que passa da narração do médico de Tommy para o clamor interno de Tommy.